sexta-feira, 9 de dezembro de 2011


O que é o amor?

 

"Amar é desejar o que não se tem". Essa belíssima frase está contida no livro "O Banquete" escrito por Platão por volta de 380 a. C., em que o mesmo faz chegar o dito pela boca de Sócrates. Como sabemos Sócrates, o filósofo, nunca deixou nada escrito, e, no entanto, foi ele o principal personagem de quase todos os livros escritos por seu dileto discípulo, Platão.

A frase é genial e de uma clareza ímpar, mas que já foi motivo de inúmeros debates mundo afora pela incompreensão aparente que ela suscita. A idéia que o filósofo grego da antiguidade levanta ou procura defender, a partir da discussão em "O Banquete" sobre Eros, ou seja, sobre o amor, é que quem ama, ama sempre algo ou alguma coisa, e essa "alguma coisa" trata-se justamente de um objeto que falta a quem ama. É justamente por não se ter algo que se vai atrás, que se mobiliza para encontrá-lo, e isso serve não só para o objeto amoroso como para tudo. Por exemplo: a condição para se adquirir conhecimento é o reconhecimento de que ele me falta e por isso quero tê-lo.

Para Sócrates é errado afirmar, no sentido de uma construção linguística, que se deseja o objeto que já possui. Seria o mesmo que dizer (essas são algumas das frases que ele usa para explicar sua afirmação), "eu que sou grande, quero ser grande", "eu que sou são, quero ser são", "eu que sou rico quero ser rico" "eu, que possuo isto ou aquilo, quero ter isto ou aquilo". Ora, se já se tem ou se é algo, como desejar ter ou ser esse algo? Haveria uma redundância, para dizer o mínimo na própria afirmação. Logo, só se pode desejar um objeto que carecemos dele. E ai a conclusão é clara, segundo o filósofo: "Quem quer que deseje alguma coisa, deseja forçosamente o que não está a sua disposição, o que não possui, o que não tem, o que lhe falta".

No caso de se desejar algo que já se possui, diz o mesmo, só se poderia afirmar então, em uma construção linguística, algo do tipo como "eu espero continuar desejando no futuro os bens que atualmente possuo".

O maior dos méritos de Sócrates sempre residiu na sua proposta dialética como forma de condução de um diálogo, a famosa maiêutica. Neste sentido, perguntar e responder sempre foram o motor por onde a construção do conhecimento aparecia. Daí a frase famosa do mesmo de que "uma pergunta pode ser mais importante que uma resposta". É algo para se pensar.

Uma dedução a partir desse jogo dialético de perguntas e respostas, é que diante de uma pergunta algo se abre, continua, não se conclui, ou pelo menos não tão rápido, enquanto que o objetivo da resposta parece ser o de "fechar", ou seja, propor um ponto final. Para quem não sabe, foi esse método socrático de propor perguntas que incomodou profundamente aos atenienses contemporâneos de Sócrates e que terminou por levá-lo a ser acusado, julgado e condenado à morte. Perguntar incomoda mas é necessário.

Na verdade, também podemos concluir, por exemplo, que em todo processo de ensino e aprendizagem (como também na Ciência) se dá através de perguntas. Sem perguntas não há saber, não há construção, e só se pode perguntar em um ambiente em que se aceita o debate. Isso me parece claro como a luz do dia. Sem questionamentos não se avança. E todo questionamento provoca uma resposta que irá exigir uma nova pergunta.

Não é à toa que as crianças (quem tem filhos sabe disso) não se cansam de bombardear os pais com suas perguntas incansáveis, os eternos porquês. Freud admiravelmente percebeu nesses primeiros gestos um desejo de conhecimento e algo importante na construção e solidificação do Eu, chamando a esse momento infantil de "o pequeno lógico". Um ambiente familiar que estimule esse gesto e um ambiente público também, pode ser o primeiro sinal de democracia e liberdade, tão importantes para a saúde pessoal e coletiva.

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